Sala de Tratamento

BACK TO BLACK

Aqui estava eu, após quase cinco meses longe da Inglaterra, torcendo para que o escândalo do meu quase casamento estivesse esquecido e ocultado para todo o sempre, afinal as pessoas não foram lá muito gentis quando descobriram que meu quase-futuro marido era um comensal remanescente da época de Darliguv. O mesmo Darliguv que havia assassinado meu pai e que havia desaparecido com minha mãe. Isso deve ter sido um prato cheio para a colunista de fofoca do Profeta. Enfim estava aqui hoje por ordem do meu tio Mark, vulgo atual chefe dos aurores, antes de admitir meu retorno ao quartel dos Aurores e como fora uma ordem do chefe e não só do meu tio, aqui estava eu para relembrar aquele fatídico dia antes de seguir com a minha vida.

Assim sendo, tomei meu assento diante da psicóloga de olhar amável, que me indagava os motivos de estar ali, ainda mais com um encaminhamento direto do chefe dos aurores. Expliquei e a pedido dela começamos a falar sobre o que me trazia a ala psiquiátrica do St. Mungus ainda que para conversar com a psicóloga.


Era o dia. O meu dia. Enfim eu chegara onde eu devia estar há meses, talvez anos. Minhas mãos tremiam e eu rezava para que tudo estivesse certo. Olhava em volta e via minha mãe sorrindo. Os lábios dela moviam-se, mas eu não escutava. Simplesmente não conseguia ouvir nada. Em algumas horas eu estaria em uma cerimônia especial. Suspirei. Que ele não desista, pensei desesperadamente. Por favor, não desista.

Olhei para minha mão em busca de forças para acalmar minha ansiedade. No meu dedo anular havia um lindo anel de noivado. Não é costume bruxo usar anel de casamento, mas ele dissera que estava tudo bem para ele, queria que eu usasse. Uni as mãos em um apelo. Não desista, pensei mais três vezes até que minha prima e dama de honra, Louise, chamou minha atenção e sorri. Nunca imaginei que as coisas acabariam daquela maneira.

Nunca acreditei muito em destino, até o dia referido. Era impossível não acreditar. É claro que qualquer casamento muda a vida de uma mulher, mas não é sobre isso que eu estava me referindo. Dessa vez, havia algo maior, algo pior e que me deixava nessa angústia. Por todos os deuses, onde estava Damian?

Assenti mecanicamente, pensando que as coisas não andavam tão perfeitas quanto eu queria desde a semana anterior. Os preparativos eram cansativos; os problemas inevitáveis me deixavam cada dia mais descrente. Sempre dizem que, se você não aguenta bem a semana antes do casamento, nunca vai aturar o casamento em si. Mas vamos pôr as coisas em pratos limpos: Damian era o cara perfeito para mim. Moreno, 1,83m, olhos verdes de matar, físico esculpido como numa escultura de Michelangelo. Bom amante e companheiro fiel. Não deixava a tampa da privada levantada. Depilava o peito, as axilas e as costas. Generoso e cheio de cultura. Amava os pais, o irmão, o sobrinho. Amava cachorros. Amava crianças. Marido em potencial.

Logo lá estava eu, de vestido branco, um branco puríssimo... Lou chorou e me disse que eu era a noiva mais linda que ela havia visto. Relembrei as reações de cada uma das pessoas que haviam me visto naquele dia. James, o melhor amigo de Damian e também um dos meus melhores amigos desde Hogwarts, falou que eu estava gostosa. Era o melhor elogio que eu poderia receber dele. Meu tio se emocionou e me deu um abraço forte. Louise, minha dama de honra, ficou dando gritinhos e saltinhos o tempo todo (exagerada eu...), e me abraçou tanto que eu tive receio de meu vestido amassar. Ou cair. Lembre-se, eu estava usando um tomara-que-caia. Ou, no caso da noiva, tomara-que-não-caia.

Ouvi uma movimentação e vozes animadas no jardim da casa e olhei pela janela. Finalmente ele estava ali. Finalmente aconteceria. Depois de alguns minutos a mãe de Damian já havia organizado tudo para que a cerimônia tivesse início. Quando surgi arrancando suspiros das mulheres ali presentes meu sorriso se ampliou. Ele estava ali, não tinha fugido.

E, pontualmente, às onze horas e dez minutos, enquanto eu deslizava alguma coisa aconteceu e levei alguns segundos para assimilar que um animal (ou coisa similar) havia atacado violentamente Damian que neste momento jazia no chão. Ouvi gritos vindos de todos os lados. Quando o ataque cessou havia sangue por todo o lado e eu estática no meio do caminho até o altar, permaneci assim até que o acompanhante da sra Walker se aproximou de mim, o terno todo ensanguentado e falou - Srta Mitchell, lamento muito mas não há nada que possamos fazer por ele, Damian está morto. Sinto muito.

Ah, sim. Essa foi definitivamente a gota d’água. Eu permaneci exatamente onde estava, encarando aquele sujeito e esperando que alguém me dissesse que aquilo era uma piadinha, uma brincadeira sem graça e que Damian se ergueria daquela poça de sangue a qualquer momento, mas ninguém disse nada, ninguém sequer se moveu. Ouvi alguns sussurros sobre alguma coisa no braço dele ao que não dei atenção porque minha mente repetia insistentemente – Não...pode... ser... – De verdade, eu queria que houvesse um manual. Tipo, O Que Fazer Quando Seu Noivo Morre No Dia Do Casamento. Ou 50 maneiras de se livrar de convidados fofoqueiros. Talvez Exercícios de Respiração – Como Controlar A Raiva Em Locais Públicos Para Noivas! Mas, neca. Eu realmente li muitas revistas sobre casamentos nos últimos meses. E eu posso garantir, jurar: nada havia me preparado para aquilo.

Damian e eu nos amávamos. Ele havia pedido minha mão em casamento num jantar romântico, como nos filmes. Eu pesquei a aliança na taça de champagne! Como ele ousava morrer e não casar comigo depois de quase me matar engasgada com os 24 quilates do anel de ouro?

O homem se desculpou mais uma vez, senti, ou melhor, acompanhei alguns dos presentes me abraçarem, meu tio dizia alguma coisa que eu não conseguia captar. Me deixei cair no chão. Por fraqueza, isso é um fato. Meu estilo de strong independent woman não aflorou na hora, como eu desejaria. Em vez disso, minha personalidade adolescente tomou conta de mim, em desespero, com a visão turva por causa das lágrimas alguns segundos antes de sentir minha visão escurecer e a fala de Louise ser ocultada por um "ele era um comensal! Quem diria!". Bem, essa foi a última coisa de que tive consciência.


Conclui o relato e ainda permanecemos conversando, ela realizando alguns testes até determinar que não havia qualquer fator, neste momento, que desabonasse meu retorno para o quartel de aurores e que seria muito bom que eu retomasse a minha rotina e pudesse seguir em frente. Agradeci, me despedi e me dirigi ao quartel esperando que aquele laudo ajudasse meu tio a agir mais como chefe do que como tio e parasse de me colocar numa  redoma como se precisasse ser protegida e posta numa redoma só porque namorei, noivei e quase casei com um psicopata.


OFF:
INFORMAÇÕES IMPORTANTES
Ellie não sabe que Damian era um agente duplo descoberto recentemente e que traíra Darliguv, daí sua morte. Para ela, Damian ficou como um mísero comensal na mente dela.  A morte e tudo relativo ao casamento dela foi amplamente divulgado pela impresa, tendo surgido teorias de que Damian ajudou na execução do pai de Ellie e no desaparecimento da mãe dela (que era uma bruxa nascida trouxa), o que está longe de ser a verdade.
Sobre o tio dela ser o chefe dos aurores foi autorizado pela ADM e sobre a morte de Damian foi combinado com novo LORD.