Corredores Centrais

Enquanto Enric se afastava o eco da risada debochada dele reverberava nos corredores como uma faca cravada no meu orgulho, podia sentir o sangue pulsando em minhas têmporas, a visão começando a ficar borrada pelo ódio que crescia, desenfreado, em meu peito, cada passo dele era um insulto, cada palavra cuspida carregada de escárnio era uma afronta que não podia tolerar, minha mandíbula travou, cerrei os dentes tão forte que senti o gosto de sangue na boca, queria quebrá-lo e não era só no sentido figurado.

Minha mente já desenhava o movimento, atravessar o corredor em dois segundos, puxá-lo pelos cabelos e enfiar a adaga bem no meio da nuca dele, sentindo o osso se partir e o sangue quente jorrar na minha mão, cada fibra do meu corpo clamava por isso, cada instinto primal gritava para dar aquele passo e acabar de vez com o verme que ousava me desafiar mas sabia, no fundo, que seria um erro, um erro que custaria tudo o que estava construindo. Minhas mãos estavam tremendo, de raiva, de frustração, levei a mão ao lado do corpo, meus dedos quase instintivamente alcançando o cabo da adaga que eu sempre carregava, seria tão fácil... Tão simples. Só um golpe, só um corte e aquele verme estaria morto, para sempre calado, a tentação era quase irresistível, mas então a imagem de Astrid inundou minha mente, suas mãos delicadas, seu sorriso tímido e soube que se desse aquele passo, tudo acabaria, minha vingança, minha chance de ter qualquer coisa além de um vazio profundo, em um erro, um momento de fraqueza e eu perderia tudo.

Forcei-me a parar, os músculos tensos resistindo a cada impulso, não agora, não aqui, se perdesse o controle, perderia muito mais do que apenas um combate contra Enric, perderia tudo. Respirei fundo, tentando acalmar a fúria que queimava dentro de mim como um incêndio incontrolável, ele estava certo em uma coisa, era um jogo de dois lados e eu precisava jogar melhor, ser mais esperto. Quando Enric virou o corredor, afastando-se finalmente, apenas permaneci ali, imóvel, assistindo ele ir embora, foi então que soltei um grito de frustração, minha voz reverberando pelas pedras frias, o som ecoou de volta para mim como um reflexo do meu próprio desespero, não podia deixar assim, não podia suportar a ideia de que ele achava que tinha vencido, meus olhos focaram na parede à minha frente e antes que percebesse, meu punho já estava arremessado com força contra a pedra, o impacto reverberando pelos ossos até meu ombro, senti a pele se romper, o sangue quente escorrendo pelos nós dos dedos, a dor trazendo uma estranha sensação de clareza.

Não deixaria as coisas assim, iria derrubar cada um deles, Enric, Eleanor, Robert, todos os que ousaram cruzar meu caminho, todos os que pensaram que podiam me subestimar, mas hoje não seria o dia, hoje eu recuaria, um passo para trás, talvez, mas apenas para tomar impulso para o golpe final, não ia desperdiçar minha chance em um ato de raiva sem sentido, o jogo não seria ganho em um momento de descontrole, seria vencido na precisão, na paciência de esperar o momento certo para atacar. Respirava pesadamente, cada lufada de ar entrando e saindo dos meus pulmões como um esforço monumental, as pontas dos meus dedos estavam dormentes, o punho latejando, mas não importava, olhei para o corredor vazio onde Enric tinha desaparecido, ele não tinha ideia de com quem estava lidando, podia achar que havia terminado mas, para mim, isso era apenas o começo, o começo do fim para todos eles, o derrubaria, derrubaria cada um deles, mas a hora certa e do jeito certo, mas por hora o tudo que podia fazer era virar as costas e me afastar, e foi exatamente o que fiz.